Face à contestação dos produtores e à enorme escalada das exportações a coberto deste mecanismo, os políticos americanos estão a unir-se para mudar a legislação e pôr fim ao de minimis.
Fonte: Portugal Têxtil – https://portugaltextil.com/de-minimis-parte-2-legislacao-americana-em-revisao/
Durante anos, a regra de minimis – que permite que encomendas abaixo de um determinado valor entrem no mercado sem pagar taxas alfandegárias – foi um fator menor no retalho americano. Mas em 2016, nos EUA o valor máximo passou de 200 dólares para 800 dólares, permitindo que artigos mais caros deixassem de estar sujeitos ao processo alfandegário habitual.
O número de encomendas enviadas para os EUA sob este recurso aumentou dramaticamente, Em 2023, pela primeira vez, mais de mil milhões de encomendas sob o de minimis passaram nas alfândegas americanas, em comparação com 134 milhões em 2015. A China é a principal fonte de encomendas, representando a maior parte das quase 3 milhões de pequenas encomendas que entram diariamente nos EUA, de acordo com os dados da Customs and Border Protection. Cerca de 30% das pequenas encomendas que chegam atualmente aos EUA foram compradas na Shein ou na Temu, de acordo com a Associated Press, que cita um relatório interno do House Select Committee sobre o Partido Comunista Chinês.
A Shein e a Temu enviam as encomendas diretamente de armazéns chineses, permitindo que os consumidores americanos comprem fast fashion, mas também dispositivos eletrónicos e outros, a preços incrivelmente baixos. As empresas americanas afirmam que este negócio está a ameaçar a sua atividade e que, a continuar, muitas lojas vão fechar e os armazéns americanos vão encerrar e abrir no estrangeiro.
Em resposta a esta tendência, vários congressistas apresentaram propostas legislativas para reduzir ou pôr fim à regra de minimis.
«É uma enorme lacuna na lei que permite, em particular, que estas duas empresas enviem uma grande quantidade de produtos para os EUA e prejudiquem os negócios americanos que estão literalmente a ser obrigados a fechar portas por esta concorrência», destaca, à revista Time, o congressista Earl Blumenauer.
No início de março, foi criada uma coligação liderada pelo congressista e que conta com sindicatos, associações comerciais e diferentes stakeholders, incluindo o National Council of Textile Organizations (NCTO), para chamar a atenção para o de minimis. Esta coligação considera que a lacuna na legislação está a ser explorada pela China e outras entidades estrangeiras para permitir que bens produzidos com recurso a trabalho forçado, assim como artigos contrafeitos e outros prejudiciais à saúde, entrem no mercado.
A Alliance for American Manufacturing e a Rethink Trade alegam que a regra de minimis favorece as empresas estrangeiras em comparação com os produtores americanos, que pode levar a concorrência desleal e potencialmente à exploração dos trabalhadores. «Estas empresas chinesas criaram negócios de milhares de milhões de dólares a explorar o de minimis, viciando os consumidores americanos em preços muito baixos e fazendo uma corrida com o retalho para baixo. Há um custo muito real escondido nestes produtos baratos e é pago pelos homens e mulheres que estão nas fábricas aqui e no estrangeiro. A provisão de minimis convida os importadores a enganarem o sistema e a explorar os seus trabalhadores. Os EUA devem fechar esta lacuna agora», sustenta Scott Paul, presidente da Alliance for American Manufacturing, citado pelo Just Style.
Segundo Halsey Cook, CEO da Milliken & Company, nos últimos anos a Temu e a Shein têm apresentado produtos semelhantes às linhas de vestuário produzidas pela Milliken a preços aberrantemente baixos, o que afetou a performance financeira da empresa americana, que se viu forçada a fechar duas unidades produtivas e a despedir centenas de trabalhadores, em parte devido a esta concorrência, afirma à Time. «O que estamos agora a experienciar na indústria têxtil doméstica é outro nível de dor e de encerramento de empresas em comparação com o passado», sublinha.
Mas há quem seja contra as mudanças na lei, alegando que uma alteração vai prejudicar os consumidores americanos. «É um novo modelo, é o futuro», sublinha Steve Story, um executivo que ajuda as empresas a exportar para os EUA sob a regra de minimis. «Para quê ter inventário nos estados quando é possível que o fornecedor fique com o inventário e o envie? Se as empresas americanas não começarem a fazer isso, vão ser deixadas para trás», acredita.
Especialistas indicam que empresas como o Walmart e a Amazon estão a seguir o mesmo modelo de negócio, usando o de minimis para enviar produtos para os americanos a partir do estrangeiro, mantendo os preços baixos.
A Temu garante à Time que «o [seu] crescimento não está dependente da política de minimis» e assegura «apoiar qualquer ajuste de política feito por legisladores que se alinhem com os interesses dos consumidores». Já no ano passado, a Shein publicou um comunicado reconhecendo que o de minimis pode prejudicar as empresas americanas que já não podem competir pelo preço e argumentou que a política «precisa de uma renovação completa para nivelar o terreno para todos os retalhistas».
Na Europa, o tema está igualmente a ser debatido, como pode ler no próximo artigo.